domingo, outubro 27, 2013

Século 21

O século 20 foi pontuado por grandes líderes. Eles ultrapassaram as fronteiras dos países onde viveram e foram ouvidos em muitos outros. É verdade que o século, também, foi um período de grandes tragédias, como as Guerras, e quase acabou com a espécie humana com um conflito nuclear. Contudo esses homens deram contribuição para que outros refletissem sobre o governo e como ele deveria conduzir a nação. Charles de Gaulle chegou à conclusão que em política há um momento que se é obrigado a optar entre trair o pais ou eleitorado. Ele disse que preferia trair o eleitorado. Logicamente por uma causa nobre, é claro. Trair o eleitorado era abandonar o que prometeu a uma parte da população, trair o país era atingir a todos e também ás futuras gerações. O que se vê no mundo contemporâneo é que os líderes foram substituídos por chefes. Graças a essa habilidade são capazes de se perpetuar no poder, não mais com golpes de estado, mas com novas pirotecnias e promessas que os consagram nas urnas. São eleitos, a máquina política triunfa quase sempre. É uma minoria unida que atua contra uma maioria dividida. Cada vez que uma minoria se junta, estabelece uma estratégia e desenvolve táticas eficientes, domina a nação. Há inúmeros exemplos na história. Um grupo unido vale muito mais do  que uma multidão sem rumo. E hoje há meios de comunicação eficientíssimos para isso, como as redes sociais. O mais escandaloso dos escândalos é que nos habituamos a eles. Passam a ser considerados “normais”. Quando Simone de Beauvoir constatou isso estava mostrando que essas situações não tem data nem local para acontecerem. Toda vez que as condições se tornam propícias  os escândalos se sucedem com rapidez e intensidade como uma porteira que se abriu para passar a boiada dos que não têm nenhum compromisso nem com o povo, nem com a nação, apenas consigo mesmo. Os mais hábeis são capazes de vestir as ideias menores com palavras maiores e desenvolver, na opinião de Lincoln, a demagogia. E com ela tudo se torna crível, e todos são chamados para escolher entre o bem e o mal, entre o povo e as elites, entre os donos da verdade e os mentirosos. Há um maniqueísmo vigoroso. Enfim, há lições que vieram do século 20 como a ensinada pelo Barão de Itararé que mandou dizer aos habitantes do Século 21 que os vivos são e serão sempre cada vez mais governados pelos mais vivos.

quarta-feira, outubro 09, 2013

Dúvidas e Mudanças

O impacto causado pela estranha adesão de Marina a Dudu "Arraes" Campos, que nas pesquisas tem menos de um terço de intenções de voto do que a "sonhatica", esconde algumas dúvidas de fundo. Em termos de propostas para o resgate de dívidas históricas que o Brasil tem com sua população e a inserção do país na economia e na geopolítica mundial, quais são as diferenças marcantes entre os que postulam o Palácio do Planalto? Existem mesmo essas diferenças? As candidaturas até aqui postas de pelo PSB e pelo PSDB traduzem uma possibilidade de alternância naquilo que é essencial para rapidamente melhorar a vida de milhões de brasileiros?
Claro que há diferenças e até divergências sobre como conduziriam a gestão da máquina estatal. Afinal, cada um expressa os interesses do bloco político e econômico específico que pode levá-los à Presidência e esses blocos diferem entre si. Claro que há, também, distinções em termos de caráter pessoal. De tudo se pode falar de Dilma, de Campos e de Marina, mas, até hoje, nunca veio a público nada que os comprometa no campo da honestidade pessoal. Aécio e Serra, cujo mácula moral mais recente é o propinoduto que o PSDB montou há décadas no sistema de transportes e energia de São Paulo, estão pra lá de inadimplentes nesse quesito e nem a imagem de impolutos podem reivindicar.
Se eleito, qual a mudança na estrutura econômica, no sentido de uma profunda e urgentíssima divisão da riqueza, que Campos, Marina, Aécio ou Serra desejariam ou pelo menos estariam dispostos a fazer? Poderiam eles conduzir alguma mudança?
O importante é a mudança na estrutura econômica e política. Há muito o sistema de representação eleitoral e o Judiciário brasileiros não passam de um teatro de marionetes que apenas visa a dar um verniz de política pública aos interesses das maiores corporações instaladas no Brasil. Ao longo de nossa história, às massas têm sido relegadas as migalhas do crescimento econômico em si concentrador de renda e riqueza. Mudança real e efetiva na economia significa, em um primeiro momento, horizontalizar radicalmente o modo de produção, para que amplas parcelas da sociedade finalmente tenham resgatadas as dívidas odiosas e históricas que o Brasil sempre produziu.

terça-feira, outubro 08, 2013

Dobrar a Renda

A FIESP lançou o documento 'Estratégia de Potencial Socioeconômico Pleno para o Brasil' em que apresenta um conjunto de ideias para dobrar a renda per capita em 15 anos, de US$ 11 mil em 2013 para US$ 22 mil em 2028. É um documento abrangente, bem elaborado e consistente que coloca em debate uma questão central: como atender aos anseios da grande massa da população brasileira de ter rapidamente acesso ao padrão de vida dos países desenvolvidos???
Hoje, todos concordamos que não é possível atender aos anseios de 200 milhões de brasileiros desindustrializando o Brasil como fizemos no Plano Real. Se a população brasileira fosse de 10 milhões, o setor agrícola poderia gerar renda suficiente para termos todos um bom padrão de vida. A FIESP aponta os maiores responsáveis por esta perda de competitividade da indústria e esgotamento do crescimento no Brasil: carga tributária distorciva (eleva os preços de produtos domésticos em detrimento dos importados), taxa de juros e spreads acima da média mundial, taxa de câmbio sobrevalorizada, infraestrutura deficiente e excesso de burocracia. Mais importante, mostra com dados que a carga tributária do setor representa, em média, 40% do preço industrial; só o custo do capital de giro responde por 8%; e a burocracia e a infraestrutura deficiente representam um custo adicional extraordinário, quando comparado aos nossos parceiros comerciais, de 5% nos preços. 
Dobrar a renda per capita em 15 anos é um enorme desafio. O PIB precisaria crescer a uma taxa média de mias  de 5% a.a.. É bom lembrar que neste início de século crescemos a uma taxa média de menos de 4% a.a.. Então, a meta proposta pela Fiesp é irrealista? Não. É excessivamente ambiciosa? Também não: trata-se de ter, uma renda per capita que representa 50% da atual renda per capita americana! É perfeitamente possível se formos capazes de aproveitar plenamente o nosso potencial estritamente econômico. Crescimento é uma questão de vontade nacional. É preciso um planejamento estratégico com objetivos claramente estabelecidos e com descrição dos meios para alcançá-los. É preciso ter um mínimo consenso sobre as prioridades nacionais. E para isto, precisamos de liderança política capaz de fazer compromisso crível de crescimento e de inclusão social. E isto já tivemos no século passado. E aí está a importância do documento, ao abrir o debate sobre a necessidade de um plano estratégico para o Brasil. As causas mais imediatas para alcançar o objetivo de dobrar a renda per capita são conhecidas: aumentar a taxa de investimento; aumentar a produtividade do trabalhador, melhorando a qualidade da educação; e reduzir o custo Brasil, afinal vivemos num mundo globalizado. O problema está nas causas mais profundas: as instituições que regem o poder efetivo, não o formal, para a sociedade se organizar de forma a controlar aqueles que detém o controle do Estado, definem as regras e a cultura que rege as decisões políticas fundamentais. São estas instituições que definem a natureza do nosso estado, da burocracia brasileira e do sistema de representação política. No Brasil estas instituições são excludentes, para utilizar uma terminologia na moda, de forma que a população participa formalmente do processo político, mas de fato e efetivamente são excluídas. Em outras palavras, nossa carga tributária é um ponto tão fora da curva. Os serviços públicos brasileiros são ineficientes quando comparados internacionalmente. A taxa de juros é mais elevada do que nos nossos parceiros comerciais. Os investimentos públicos e privados em infraestrutura são baixos. Nossa taxa de câmbio esta, persistentemente, apreciada, transferindo empregos para o exterior. 
Com certeza a sociedade brasileira não aprova estas condições nas quais opera nossa economia. Se as instituições se tornarem inclusivas e permitirem que todos os grupos da sociedade participem efetivamente nas decisões politicas, com certeza resolveremos estes problemas. Dobrar a renda per capita em 15 anos deixará de ser sonho, para ser um projeto de todos.

REFORMAS

A taxa de desenvolvimento de um país pode ser vista como a soma de três componentes: a resultante do seu próprio esforço interno e da qualidade da sua política econômica, os efeitos de sua interação com o mundo, no que tange ao movimento de capitais e de comércio, que dependem, por sua vez, do esforço interno e da qualidade da política econômica dos seus parceiros internacionais e de "choques" globais que afetam simultaneamente todos os países, ainda que cada um à sua moda. É isso que explica o nível da "covariação" entre as taxas de crescimento dos vários países. Em setembro último, comemorou-se o quinto ano desde a enorme barbeiragem das autoridades monetárias americanas e inglesas, que foram atropeladas por sua incompetência em organizar a saída do Lehman Brothers do mercado. Finalmente parece que a justiça começa a bater nas portas dos que foram diretamente responsáveis pela destruição de 1/3 do PIB mundial e pelo desemprego de mais de 40 milhões de pessoas, que viviam honestamente do seu trabalho, enquanto eles continuaram a acumular formidáveis patrimônios. A recessão iniciada em 2008 foi muito profunda e a recuperação lenta. As medidas monetária e fiscal foram insuficientes e mal coordenadas, não apenas por dificuldades políticas, mas também porque estávamos sem bússola numa noite escura num mar revolto nunca dantes navegado... Os sinais de recuperação das economias desenvolvidas são tênues, modestos e contraditórios. Por outro lado as emergentes, que foram o suporte do crescimento global, parecem imergir, iniciando um ciclo de menor crescimento. O Brasil talvez tenha antecipado o ciclo, pelos efeitos da segunda componente mencionada acima, além de problemas próprios, como a queda de confiança do setor privado e a lentidão para fazer obras eficientes de infraestrutura. A verdade é que temos respondido frouxamente a algumas reformas absolutamente necessárias, como a radical simplificação do sistema tributário, o enfrentamento do problema previdenciário e a redução do dramático aumento das incertezas produzidas pela ação discricionária do Tribunal Superior do Trabalho. Seguramente, não é o presente desconforto com relação às políticas monetária e fiscal que preocupa os potenciais investidores. O que importa é o temor que a aparente pouca importância dada às reformas acabará por tornar o Estado insustentável.