segunda-feira, janeiro 31, 2011

De tanto mentir, a FOLHA perdeu a liderança


O Instituto Verificador de Circulação (IVC) fechou o seu balanço com o desempenho dos jornais brasileiros em 2010. O resultado final ficou próximo de uma leve alta de 1,5% na circulação total. A principal novidade é a perda de liderança da Folha de S. Paulo, que era o jornal de maior circulação no país desde 1986. Embora já tivesse perdido a liderança em alguns meses, em 2010 isto ocorreu pela primeira vez no consolidado de um ano. O topo do ranking do ano passado foi do Super Notícia, título popular de Belo Horizonte. Enquanto a Folha manteve estabilidade, na casa dos 294 mil exemplares por edição, o Super Notícia cresceu 2%, atingindo média de 295 mil. Entre os dez títulos líderes, a maior alta foi de O Estado de S. Paulo, que avançou 11%, chegando a 236 mil exemplares por edição. A maior quedas foi do Lance, que encolheu 24%, ficando próximo de 95 mil exemplares por edição.

Balanços

Quase todos os analistas que fizeram neste final de semana um balanço do primeiro mês do governo de Dilma Rousseff destacaram o estilo discreto da Presidente, uma gestora mais dedicada à administração, em comparação ao seu antecessor, um líder político de massas, que gostava de discursar e viajar. Era natural que assim fosse, já que Dilma e Lula têm personalidades e trajetórias de vida muito diversas. Fora isso, é como se o novo governo fosse apenas uma continuidade do anterior, não só pela manutenção de metade do ministério, mas, principalmente, por ter optado pela mesma política econômica e as mesmas prioridades na área social. Isso é bom ou ruim? Pois eu acho muito bom o Governo e a Presidente ficarem fora das manchetes, dando espaço para outros setores da sociedade e temas da vida real. Isto é um sinal de normalidade democrática. Sempre falei que tinha Brasília demais e Brasil de menos na nossa imprensa, quer dizer, muito espaço para o mundo oficial e suas autoridades. Sem entrar no mérito se esta cobertura foi positiva ou negativa no governo passado, já que há avaliações diferentes dos dois lados do balcão, o fato é que ela foi exagerada, onipresente, quase sufocante. Cheguei a comentar isso, para espanto dos meus colegas: “A meu ver, tem noticiário do governo demais no Jornal Nacional”. Em seu comentário radiofônico desta segunda, Alberto Dines reparou que os jornalistas estavam mal acostumados na cobertura do governo Lula, que dava manchete quase todo dia cada vez que falava, e ainda não descobriram como fazer para contar o que está acontecendo no governo Dilma. Sem declarações nem medidas de impacto da Presidente, o noticiário se limita às futricas do poder, sempre em busca de uma crise entre partidos aliados ou entre ministros. Como Dilma, ao contrário de Lula, foge das bolas divididas e evita polêmicas, não deve estar sendo fácil o papel de editor de política neste novo governo. Para o meu gosto e o da maioria das pessoas com quem tenho conversado, o governo Dilma começou muito bem!

sexta-feira, janeiro 28, 2011

Contra a tradição da história

Apesar de ainda não confirmada oficialmente, a possível candidatura do atual presidente do São Paulo Futebol Clube Juvenal Juvêncio a um novo mandato, e sua vitória na disputa, é praticamente dada como certa nos bastidores políticos do clube. Contudo, caso a decisão seja confirmada, irá contra uma história de alternância na presidência que já dura mais de quarenta anos. JJ já está há cinco anos no comando do São Paulo e, com um novo mandato até 2014, chegaria a oito, tornando-se o terceiro dirigente a permanecer mais tempo no cargo - isso considerando apenas o atual momento, sem contar seu primeiro mandato, entre 1988 e 1990. E quebraria uma tradição: desde 1971 ninguém fica mais de cinco anos na presidência do clube. O último a superar tal marca foi o Governador de São Paulo Laudo Natel. Principal responsável pela construção do estádio do Morumbi ao lado de Cícero Pompeu de Toledo, Natel também é o recordista de anos à frente do São Paulo, ficando por 13 temporadas como presidente, entre 1958 e 1971. Toledo, que o precedeu, é o segundo colocado, com nove anos, entre 1948 e 1957. Com as exceções dos presidentes que dominaram os anos 50 e 60, o São Paulo teve apenas outros dois presidentes que ficaram por cinco anos, como Juvenal: Edgard de Sousa (primeiro mandatário e Henri Couri Aidar. Todos os outros ficaram no cargo por períodos de quatro anos ou menos. É verdade que Cícero Pompeu de Toledo e Laudo Natel se tornaram dois dos mais importantes presidentes da história são-paulina. Afinal, o primeiro foi o responsável por dar início às obras do Morumbi (e inclusive dá o nome ao estádio), enquanto o segundo levou a construção até o final. Mas também é verdade que o período de seus mandatos (48-71) foi de vacas magras em termos de títulos, com as conquistas de apenas 6 Campeonatos Paulistas. Nos 75 anos do São Paulo, parece inclusive existir uma relação entre duração do mandato e conquista de títulos. Os dois períodos mais vitoriosos do clube aconteceram sob o comando de presidentes que ficaram quatro anos no cargo. Entre 1990 e 1994, José Eduardo Mesquita Pimenta conquistou dois mundiais, duas Libertadores, duas Recopas Sul-Americanas, uma Supercopa, um Brasileirão e dois Paulistas. E entre 2002 e 2006, Marcelo Portugal Gouvêa levou o clube a um Mundial, uma Libertadores, um Brasileiro e um Paulista. Resultados esportivos à parte, o fato é que a extensão do mandato de Juvenal também contraria o movimento recente dos principais clubes de São Paulo em busca de alternância política. O Palmeiras, depois de 12 anos com Mustafá Contursi, já teve Affonso Della Mônica e Luiz Gonzaga Belluzo como presidentes desde 2005. E o Corinthians, após 14 anos de Alberto Dualib, está com Andrés Sanchez no poder desde 2007 e terá um novo presidente eleito em dezembro.

quinta-feira, janeiro 27, 2011

Cápsula da Cultura

O Cisne

Há anos em que a América Latina está em baixa no Fórum Econômico de Davos, e outros, como agora, em que o patinho feio vira cisne. Basta ver que ontem a sala onde se realizou um debate sobre a situação da região ficou lotada, com gente de pé. Os anos críticos têm sido mais frequentes, mas certamente há muito tempo não se tem tanta boa vontade com a região, e em especial com o Brasil. Se considerarmos que houve ano em que sugeriram que fosse retirado o B dos BRICS, pois o Brasil não conseguia crescer no mesmo ritmo dos demais emergentes, a percepção hoje é totalmente diferente. Há, sobretudo, o espanto pelo fato de o país ter conseguido crescer e ao mesmo tempo distribuir renda, o que foi destacado por Moisés Naím, editor da revista Foreign Policy, numa mesa redonda sobre a América Latina. Embora a redução da desigualdade tenha sido questionada, já que ela aconteceu entre os salários e não na relação salários-ganhos de capital, Naím destacou que a redução do Índice de Gini mostra que a desigualdade foi realmente reduzida nos últimos anos. A melhoria do Gini havia sido citada por Ricardo Villela Marino, CEO do Itaú Unibanco, como um dos muitos sinais de avanço na economia brasileira. Moisés Naím, aliás, destacou outras economias que chamou de “estrelas conhecidas”, como o Chile, mas também algumas “surpresas”, como Colômbia, Peru, Uruguai, Panamá e Costa Rica. Houve um consenso, resumido por Enrique Iglesias, ex-presidente do BID: "nunca a região foi tão democrática quanto hoje, e nunca esteve tão bem situada economicamente, o que faz com que seja previsível uma década de crescimento pela frente". Sintomaticamente, os problemas existentes, como a alta da inflação e a questão fiscal, foram citados apenas de passagem, ficando claro que não há nenhum temor de que os países da América Latina que aprenderam a lição das crises permanentes anteriores venham a perder o controle fiscal. Mais uma vez o que foi destacado por todos, mas bem definido por Marino, foi que os países da região, mais especificamente o Brasil, precisam cuidar de seus pontos fracos: investimentos em infraestrutura e, sobretudo, em educaçãoMas nem tudo é festa na região. A parte negativa ficou para a Venezuela e os países da chamada Aliança Bolivariana (Alba), como Equador ou Bolívia. Naím, venezuelano radicado nos Estados Unidos, definiu o socialismo do século XXI de Hugo Chávez como uma “ideologia necrófila” — “Nunca vi gostar tanto de ideias más e mortas”, comentou. Um relato sobre a situação econômica da Venezuela nos dias atuais mostrou um país com a inflação descontrolada, com desemprego crescente e um aumento da pobreza extrema, que já não pode ser solucionada por programas assistencialistas, mesmo porque o governo já não tem condições econômicas de sustentá-los. O presidente do Panamá, Ricardo Martinelli, presente ao debate como assistente, quis saber quais as chances de a oposição vencer a próxima eleição e disse que a situação da Venezuela provocava nele sentimentos “de satisfação e tristeza”. Satisfação porque, sempre que a crise piora, seu país recebe investimentos de empresários venezuelanos que lá buscam refúgio para si e seus negócios. E tristeza porque esta não é a maneira ideal de melhorar, às custas de problemas de outros. Soube que há uma chance real de que, na eleição presidencial de 2012, a oposição derrote Chávez, que já está há doze anos no governo e ampliou seus poderes aproveitando-se de uma decisão errada da oposição de não participar das eleições congressuais anos atrás. Nas recentes eleições, a oposição teve 52% dos votos, mas só elegeu minoria de congressistas devido às regras eleitorais venezuelanas. A questão é saber se a oposição conseguirá se unir em torno de uma candidatura para combater Chávez. Mas até mesmo a Bolívia recebeu de Iglesias análise de boa vontade. Ele disse que o resultado da eleição do indígena Evo Morales para a Presidência do país foi importante para integrar uma parte da sua cidadania, e que os resultados têm sido melhores do que se poderia esperar. O que chamou a atenção de Naím foi o fato de nenhum dos painelistas ter se referido à situação da Argentina, nem para criticar nem para elogiar: “Isto certamente não é um bom sinal”. O comentário final foi sobre a perspectiva de Dilma Rousseff como presidente do Brasil, na sucessão de Lula. Naím foi enfático ao afirmar que considera a nova presidente capaz de dar continuidade com sucesso aos programas de governo, mas reafirmou sua crítica à posição brasileira na política externa durante o governo Lula, “que nunca se pronunciou sobre os ataques à democracia que ocorrem na Venezuela. Espero que a presidente Dilma seja capaz de reverter essa situação”. No programa oficial do Fórum Econômico Mundial há uma advertência: até o momento em que esse programa foi para a impressão, todas as pessoas que participam e todas as sessões estavam confirmadas. Mas o desenrolar dos acontecimentos é de tal ordem que pode haver algumas modificações. Foi o que aconteceu com a fala de abertura do presidente da Rússia, Dmitri Medvedev. No primeiro momento ela foi cancelada, devido aos atentados terroristas no aeroporto de Moscou, para depois ser confirmada, embora a permanência de Medvedev em Davos tenha sido drasticamente encurtada.

quarta-feira, janeiro 26, 2011

Espanha

Através dos meios de comunicação e conversando com acadêmicos e militantes sindicais, pude constatar o tamanho do buraco onde a Espanha esta metida através das “aventuras” da banca oficial jogando e apostando nos capitais de risco. A solução que vem da Comissão Econômica da União Européia e do FMI não é boa para a maior parte do povo que habita a Península. A receita implicaria em aumentar a idade mínima para a aposentadoria; diminuir a ajuda do seguro-desemprego; enxugamento da máquina pública em todos os níveis, com especial atenção para a redução dos orçamentos dos governos sub-nacionais, mirando nos gastos e endividamento das autonomias, batendo duro naquelas com pretensões nacionalistas como Catalunha, País Basco e Galícia; tudo isto sem falar em medidas privatizadoras e os acordos coletivos para a redução de salários. Esta última já ocorreu em Portugal, com os salários de servidores públicos reduzindo-se em 10%, sendo aprovada goela abaixo da classe trabalhadora e sem uma resposta a altura. A festa acabou e quem irá apagar as luzes será o segundo governo de Zapatero, primeiro ministro do PSOE – um partido outrora social-democrata, mas no momento, quando muito, um síndico dos desígnios da União Européia. As correlações de forças são relativamente simples de descrever. Alemanha e França põem no caixa comum da UE os fundos mais substanciais. Na Espanha em particular bancaram a festa do crescimento e da distribuição de renda – direta e indireta - num ciclo expansivo que tem como ano zero 1992 – Olimpíadas de Barcelona – e não sendo mais interrompido até o final do inverno de 2009. Segundo Angela Merkel e Nicolas Sarkozy, o Estado Espanhol demorou a reconhecer os problemas e tardou mais ainda em começar a apertar o cinto de suas contas públicas. Aquilo que aparece como “crise” é de fato o reflexo da maior transferência de renda da história da humanidade, saindo do pagador de última de instância e indo tapar o buraco dos bancos com pouca liquidez. O dinheiro que jorrava para gastos de todos os tipos, alimentando a bolha imobiliária, endividou a população e elevou as margens de lucro de bancos e empreiteiras a níveis inimagináveis. Agora, a “solução” apresentada como luz no fim do túnel é recessão, conformidade com o desemprego e aumento da precariedade no mundo do trabalho. A tensão social vai recomeçar.

terça-feira, janeiro 25, 2011

Todo apoio a Graziano na FAO


Merece integral e irrestrito apoio a candidatura de José Graziano da Silva à direção-geral da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO).
O professor Graziano trabalhou no programa Fome Zero e, há quatro anos, dirige o escritório latino-americano da FAO.

Quase nada

Costumo usar um microscópio apontado para o que está escondido debaixo do tapete. Desta vez, troco-o pelo telescópio, que mostra um Brasil visto de longe, ao largo das imperfeições do cotidiano. O que revela essa imagem? Faz um século, não éramos quase nada. Um país formado de índios na Idade da Pedra, africanos na Idade do Bronze, e colonizado pela nação mais arrasada da Europa Ocidental. Os dois primeiros não possuíam escrita. Em 1900, Portugal tinha a mesma taxa de alfabetização (15%) que a Europa antes de Gutenberg. Os imigrantes da Europa Central fizeram diferença. Mas não foram tantos assim. Os visitantes descreveram o nosso arraso social. Segundo Darwin, “nossos anfitriões têm maneiras deselegantes e desagradáveis; as pessoas e as casas são imundas”. Para Eschwege: os mineiros não fazem uma caminhada de meia hora para ver e aprender alguma coisa”. Em 1900, o Rio de Janeiro estava proscrito para estrangeiros, pela sua insalubridade. A esperança de vida andava por volta de 30 anos, a mesma da Europa na Idade Média. Entramos no século XX com renda per capita menor que a do Peru e cinco vezes menor que a da Argentina e com nossas revistas escritas e impressas na Europa. Mas a economia disparou. Entre 1870 e 1987, nosso PIB cresceu 157 vezes, comparado com 84 vezes para o Japão e 53 vezes para os Estados Unidos. Ou seja, por mais de um século lideramos o crescimento mundial. Por volta da II Guerra Mundial, importávamos palitos, sapatos, biscoito, lápis, manteiga, banha, cerveja, tecidos e roupas. O salto econômico foi enorme. Viramos um país industrializado, ficamos à frente da Alemanha em produção de automóveis, liderando em fabricação de ônibus e sendo o terceiro maior produtor de aviões comerciais. Trocamos uma agricultura semi-feudal por um agronegócio de forte base tecnológica, apoiado em pesquisa de primeira linha. Em 1950, não publicávamos artigos científicos no exterior. Hoje, chegamos à 13ª posição mundial. A revolução do Etanol tem como epicentro a região de Ribeirão Preto, que, em 1932, Peter Fleming assim descreveu: “Os escassos povoados davam a aparência de pobreza, estagnação e de serem incapazes de esperanças ou desesperos”. Os indicadores sociais subiram vertiginosamente. Esperança de vida, posse de bens duráveis, tudo cresceu, e não foi pouco. Os retardatários são distribuição de renda, criminalidade e esgoto tratado. Também o mau uso do meio ambiente. Embora os números da educação sejam péssimos, nossa irritação presente nos cega para os avanços obtidos. Em 1900, por volta de 90% da população não sabia ler. Nessa época, Uruguai e Argentina já tinham uma sólida rede escolar pública. Agora, praticamente todos os brasileiros (de 7 a 14 anos) estudam. Faz pouco, Paraguai e Peru tinham estatísticas de escolaridade superiores às do Brasil. Hoje, chegamos bem perto dos melhores latinos. Falta muito, mas melhorouNo plano social e político, vamos bem – pelo menos nas comparações. Temos uma sociedade heterogênea, mas culturalmente integrada e com forte sentido de identidade e nação. Exibimos uma invejável tradição de paz social e tolerância. Nossa democracia dá uns espirros, mas tem boa saúde. Também não há problemas com vizinhos e fronteiras. Os otimistas aplaudirão. Os pessimistas acharão pouco. Talvez algumas comparações sejam esclarecedoras. No nosso canto do mundo, a Argentina brilhou no passado, mas perdeu o fôlego. O Chile vai bem, mas em 1895 já tinha 38% de alfabetização, quatro vezes a do Brasil de então. E pelo mundo afora? Não há nada para invejarmos na África ou no mundo árabe. Para chegar aonde está, a Europa levou 2 000 anos. Mesmo assim, vários países ficaram para trás (como Grécia e Turquia). Brilham as sociedades de etnia chinesa. Mas, como comparar, se têm 3 000 anos de tradição e tiveram altíssimo nível de desenvolvimento no passado? Por exemplo, a Coreia desenhou o próprio alfabeto no século XV e fundou sua academia de ciências no XVIII. E a Índia, ainda mais heterogênea? Comparar com os sucessos das cidades high-tech ou com a miséria e o sistema de castas? O milagre brasileiro é ter avançado tanto, apesar da origem vira-lata do país e dos escandalosos descompassos do presente.

sexta-feira, janeiro 21, 2011

Cápsula da Cultura

Mais uma irresponsabilidade


Na última semana,  Franco da Rocha, a 45 quilômetros da capital paulista, “ganhou” o noticiário nacional. Na quarta-feira, 12,  amanheceu inundada, inclusive a Prefeitura. Em certos lugares, a água subiu 2 metros. A população de 120 mil habitantes ficou ilhada. Sábado, 16 de janeiro, os moradores começaram a voltar para casa. A remoer-lhes esta dúvida: A Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo) agiu corretamente ao abrir as comportas? “Por telefone, no dia 11 [terça-feira], a Defesa Civil de Franco da Rocha foi comunicada que no dia seguinte [12, quarta-feira] a Sabesp iria abrir as comportas da represa Paiva Castro e liberar 15 metros cúbicos por segundo [15m³/s]”, diz João Cruz, assessor de imprensa da Prefeitura do município. “Nada mais foi dito.” Para o Governador Geraldo Alckmin (PSDB), a Sabesp acertou ao abrir as comportas da represa Paiva Castro. Será? A Sabesp teria agido no momento adequado?

segunda-feira, janeiro 17, 2011

Rebelião popular derruba Ditador


Uma rebelião praticamente ignorada pela grande mídia derrubou um ditador protegido e muitas vezes até elogiado. Agora foi Ben Ali, na Tunísia, Norte da África. O deposto era incensado pela velha imprensa que nunca deu o devido e merecido destaque à corrupção e à incompetência do regime tunisiano agora posto abaixo por uma Revolta popular. A revolta na Tunísia deve agora contaminar os países vizinhos. Fica aqui o registro do êxito da Revolta e de seu exemplo e impacto em todos os Países Árabes.

A tragédia esquecida de São Paulo

As proporções gigantescas assumidas pela calamidade na Região Serrana do Rio de Janeiro levou a mídia a relegar a um 2º plano, às últimas páginas do noticiário o drama das enchentes que assolam São Paulo desde o início das chuvas de verão, há um mês e meio.

sábado, janeiro 15, 2011

Olhar

Cesar Cielo é um sujeito de sorte. Claro que sua performance histórica no mundial de natação em Dubai tem mais a ver com os anos de dedicação e de suor e com tudo aquilo de que abriu mão ao longo de sua vida para chegar aonde chegou. Sem deixar de lado a eventual sorte genética com que foi premiado pelo papai do céu, a sorte de Cesar a que me refiro tem mais a ver com a época em que nasceu. Uma época na qual seus feitos podem ser vistos e festejados por milhões de pessoas e que, por isso, permite não só que colha os frutos de sua batalha em termos de reconhecimento e prestígio, mas que consiga contratos, negócios e uma remuneração digna de suas realizações absolutamente incríveis. Este seu colega do time olímpico de natação brasileiro não teve a mesma sorte. João Gonçalves Filho esteve em nada menos que sete olimpíadas representando o Brasil. Sendo cinco como atleta, em duas modalidades diferentes de esportes aquáticos. Ao lado, aliás, do famosíssimo intérprete do Tarzan, o norte-americano Johnny Weissmuller, forma a única dupla conhecida de atletas a disputar duas modalidades diferentes de esportes de água numa mesma edição dos Jogos. Helsinque em 52, Melbourne em 56, Roma em 60, Tóquio em 64 e México em 68. Além de excepcional nadador desde criança, João é considerado um dos melhores jogadores de polo aquático da história do esporte no Brasil. Atuou como jogador e depois como técnico, responsável por gerações de atletas treinados nas piscinas do Pinheiros, clube do seu coração e ao qual dedicou sua vida. Somados apenas seus principais títulos na natação e no polo, temos incríveis 26 títulos sul-americanos e 6 medalhas de jogos Pan-AmericanosSe tudo isso não bastasse, João é uma lenda também no judô. Faixa-preta desde os tempos do Exército, foi técnico e integrante da equipe olímpica brasileira, tendo tido papel fundamental na formação de judocas geniais como Aurélio Miguel e Douglas Vieira, para citar apenas os medalhistas olímpicos de uma enorme lista. O judô levou Gonçalves a outras 2 Olimpíadas, como técnico e treinador. Barcelona em 92 e Atlanta em 96, fechando o espantoso número de 7 Jogos. Sim, considerando seus 5 Jogos como atleta e os 2 como técnico, João Gonçalves Filho é o brasileiro com o maior histórico de participações em Olimpíadas em todos os tempos. O verdadeiro espírito esportivo, um espírito grande, que viveu numa época em que ser atleta ficava no limite entre o exótico e a loucura, na cabeça de boa parte da sociedade. Para sustentar a família, chegou a atuar como caminhoneiro e abrir academia de musculação e ginástica, entre outras atividades com as quais conseguiu criar sua família sem se afastar do esporte. João morreu no dia 27 de junho, aos 75 anos. Se poucos fora do mundo das piscinas e tatames sabiam de seus feitos geniais, menos ainda souberam de sua morte. Uma nota de pesar do comitê olímpico e outras duas ou três em rodapés de publicações esportivas...Muito pouco. Tão pouco que faz lembrar de um ditado tão antigo e gasto quanto verdadeiro: Um povo que não reverencia o passado não tem direito ao futuroSe o reconhecimento público foi pequeno, é importante registrar que o carinho, o respeito e a gratidão dos que com ele treinaram, competiram ou conviveram foram e são enormes. Uma boa amostra da intensidade do amor e da alegria com que Gonçalves curtiu sua incrível existência pode ser vista em http://is.gd/j62vK . João foi grande, dentro e fora do esporte.

sexta-feira, janeiro 14, 2011

Foto Oficial da Presidência da República

Cápsula da Cultura

Terra em colapso

Vendo as terríveis imagens da tragédia na Região Serrana do Rio, de tudo o que foi mostrado de mais chocante na caudalosa e competente cobertura da TV, ficaram na minha cabeça as palavras balbuciadas por um menino flagelado: “Parece que o mundo está acabando… 
É exatamente isto o que sinto faz algum tempo. O homem abusou da natureza, foi longe demais nas suas ambições e na sua irresponsabilidade, e a natureza está se vingando. Foi ontem, em São Paulo; hoje, no Rio; dias atrás, nas enchentes na Austrália, nas torrentes de neve nos Estados Unidos e na Europa. Cada hora num lugar, a terra está entrando em colapso. Nas ruas das grandes cidades cada vez mais congestionadas de automóveis ou nos aeroportos superlotados de gente mundo afora, nos espigões que brotam sem parar onde antes conviviam pequenas casas geminadas, parece que o mundo ficou pequeno para tanta gente, tantas máquinas, tanto consumo, e não suporta mais carregar este peso. Agora, não adianta procurar culpados, acusar governantes, reclamar da falta de planejamento urbano e de cuidados com o meio ambiente. Já foi. Somos todos responsáveis, somos todos vítimas. É uma estupidez querer fulanizar, partidarizar ou politizar as tragédias que se multiplicam pelo Brasil e pelo resto do planeta. Nesta quarta-feira, por uma ironia do destino, foi lembrado no mundo todo o terremoto que abalou um ano atrás o pobre Haiti, transformado num grande acampamento de miseráveis sobreviventes. Na rica região de Petrópolis, Teresópolis e Nova Friburgo, o belíssimo cenário europeu das terras cariocas, que quase foi varrido do mapa pelas águas, vimos o que pode acontecer a qualquer hora, em qualquer lugar, independentemente da condição social dos moradores, se cada um de nós não for capaz de perceber o perigo que estamos todos correndo, e fizer alguma coisa para evitar novas tragédias. Não sei se foi por alguma premonição. Mas, já sugeri, aqui mesmo, que a gente fizesse de 2011 o “Ano Menos”, baixando um pouco a bola para podermos continuar jogando. Resta saber o que é possível fazer e se ainda dá tempo.

quinta-feira, janeiro 13, 2011

Senadores dos EUA contra tarifação do etanol

Dois senadores do Partido Republicano, John McCain (Arizona) e John Barrasso (Wyoming) visitaram o Brasil e fizeram declarações simpáticas, de apoio às queixas brasileiras contra o protecionismo de Washington. Manifestaram-se, particularmente, contra a prorrogação por seu país do subsídio ao etanol e da tarifa de importação sobre o produto até 31 de dezembro deste ano. Os EUA e o Brasil são os dois maiores produtores e consumidores mundiais de álcool combustível.

É possível investir no futuro

João tem que escolher entre investir na educação do filho ou ajudar o pai a trocar de carro. Talvez ele não saiba, mas já optou pelo carro novo do vovô. Os investimentos em educação básica no Brasil estão abaixo da média mundial. Seu filho será mais um analfabeto funcional. Enquanto isso, os impostos que João paga sustentam os maiores gastos previdenciários do mundoOs 27 milhões de aposentadorias do INSS não são nenhuma maravilha. Nossos gastos previdenciários são inflados por menos de um milhão de aposentados e pensionistas do setor público – um em cada 200 brasileiros. Presidente Dilma, é hora de regulamentarmos a reforma da Previdência do setor público, aprovada em 2003. O que é melhor, receber R$ 1.500,00 por mês mais férias, 13º, vale-transporte, vale-alimentação e outros benefícios ou ganhar R$ 3.000,00 todo fim de mês sem os benefícios? Ou o novo governo reforma nossa caduca legislação trabalhista – supostamente desenhada para defender os trabalhadores – ou João continuará a receber metade do que seu patrão paga. Faz sentido gastar cerca de R$ 40 bilhões em infraestrutura e R$ 50 bilhões com as reservas internacionais, como fez o governo brasileiro em 2010? O Banco Central acumula reservas para limitar a queda do dólar e proteger as exportações brasileiras. Não seria melhor investirmos muito mais em infraestrutura, reduzindo o custo Brasil e tornando nossas empresas competitivas, mesmo com um dólar mais baixo? Melhor pagar R$ 15.000 ou R$ 26.000 pelo mesmo carro? Se nossos impostos sobre produção e venda de automóveis fossem similares aos dos EUA ou Alemanha, um carro zero-quilômetro que aqui custa R$ 26.000 à vista, custaria por volta de R$ 15.000. Financiado fica ainda muito mais caro. Já passou da hora de uma reforma tributária que reduza substancialmente os impostos, barateando produtos e inserindo milhões de consumidores no mercado. Imagine que Dilma fizesse tudo isso. Acabando com as diferenças entre os sistemas de aposentadoria para trabalhadores dos setores público e privado, sobrariam recursos para melhorar nossa educação, gerando trabalhadores mais bem preparados e mais produtivos. Uma reforma trabalhista que reduzisse o custo de contratação geraria salários maiores e mais empregos formais, reduzindo e, eventualmente, até eliminando o déficit da previdência do INSS. Investindo mais em portos, estradas, ferrovias e aeroportos, ganharíamos competitividade e poderíamos gastar menos com as reservas. Gastos menores com reservas e previdência do setor público, arrecadação de impostos maior com mais empregos, melhores salários e maiores vendas fortaleceriam as contas públicas, criando condições para juros menores. Com impostos menores, salários mais elevados, produtos e crédito mais baratos, seria a festa do consumo. João poderia investir na educação do filho e ajudar o pai a trocar de carro. Enfim, com as escolhas certas, é possível investir no futuro de todos sem ter de sacrificar muito o passado de algunsFalando em futuro, sem ter feito nada disso, a popularidade do presidente Lula chegou a 87%. Imagine aonde Dilma chegaria.

Cápsula da Cultura

quarta-feira, janeiro 12, 2011

Cenário

O tão aguardado leilão da dívida portuguesa surpreendeu, tendo atingido o topo da oferta de € 1,25 bilhão, com juro de 5,4% para aqueles com vencimento de quatro anos e de 6,7% para aqueles com maturidade em 2020. No mercado, yield superior a 7% indicaria que o país estaria precisando de recursos do FMI e do Fundo de Estabilização Financeira do Euro.
Passando para a agenda norte-americana, após os primeiros dias desta semana terem sido fraco, esta sessão trará dados de maior peso. Primeiramente, os mercados deverão acompanhar com atenção à publicação do Livro Bege do Fed, relatório que aborda a atual situação econômica do país. O Departamento do Tesouro também divulgará dados mensais sobre o orçamento governamental. Ainda nos EUA, a quarta-feira traz os relatórios Import Prices, excluindo o preço do petróleo devido a sua volatilidade, e Export Prices, com exceção da agricultura, também pela volatilidade de preços. Os relatórios acompanham a performance dos preços dos produtos importados e exportados, indicando possíveis tendências inflacionárias.
No cenário doméstico, a agenda trará o Índice de Custo de Vida, do Dieese. No relatório constam informações a respeito do custo de vida dos moradores do município de São Paulo, através de dados referentes à assistência a saúde, transporte coletivo e domicilio. Além disso, o Banco Central publica o IBC-Br. O índice é um indicador que incorpora a trajetória das variáveis consideradas essenciais para o desempenho de três setores da economia: agropecuária, indústria e serviços. Por fim, segundo o IBGE, em novembro de 2010 o volume vendido pelo comércio varejista restrito (que não inclui veículos, peças e material de construção) avançou 9,9% em relação ao mesmo mês de 2009.

São Pedro e o lixo não foram os responsáveis pelas enchentes...

Filho feio não tem pai. Já se o rebento tem pedigree, sobram candidatos. José Serra, é hors concours na área.  Assume como dele a criação do Programa Nacional de DST/Aids considerado um exemplo no mundo. Só que a verdadeira criadora é a Doutora Lair Guerra de Macedo RodriguesSerra, pai dos genéricos? PSDB, criador dos genéricos? Assumir como deles é um embuste!”, disse o médico Jamil Haddad, falecido aos 83 anos. Deputado federal, Prefeito do Rio Janeiro e Ministro da Saúde, Haddad é o verdadeiro pai dos genéricos do BrasilEm compensação, Serra nunca é pai de perebentos. Inexoravelmente culpa os outros. Tanto que terceirizou a paternidade das inundações em São Paulo. Afirmou que o "problema da enchente foi a enorme, anormal e atípica chuva"Para colocar os pingos nos is, entrevistamos o engenheiro Júlio Cerqueira César Neto. Durante 30 anos – está com 80 – foi professor de Hidráulica e Saneamento da Escola Politécnica/USP. É considerado um dos grandes especialistas do Brasil nessa área.
Nos últimos meses, São Paulo submergiu duas vezes. O prefeito Gilberto Kassab (DEM) e o PSDB culparam principalmente a “quantidade anormal de chuvas no período” e “ lixo jogado na rua pela população”.  São Pedro e o povo são os responsáveis por essas duas inundações históricas?
Júlio Cerqueira César Neto – Não.  Querendo dourar a pílula,  as autoridades lançaram mão de vários parâmetros para confundir a opinião pública. Esses fatores realmente existem.  Porém, São Pedro e a educação sanitária não são os causadores das enchentes.
São Pedro não teve mesmo culpa no cartório?
Júlio Neto – Nas inundações deste ano, São Pedro está completamente isento. As chuvas não foram catastróficas, elas foram moderadas. Aliás, sempre que acontece uma enchente dessas, o prefeito, o governador, os secretários aparecem dizendo que São Pedro foi o responsável. Nada deixa a população mais irritada do que essa desculpa esfarrapada.
E o lixo jogado na rua?
Júlio Neto – Prejudica um pouco, mas não é o principal. É só um fator colocado no debate pelas autoridades para confundir a opinião pública, e esconder os verdadeiros responsáveis.
Então quais as causas principais dessas enchentes?
Júlio Neto – Uma delas, o assoreamento do Tietê. Assoreamento é o material sólido que vem na corrente líquida do rio: terra, erosão, lixo, entulho de obra. Na cidade de São Paulo, a declividade do Tietê é muito pequena e a velocidade, muito baixa. É como se o rio estivesse quase parado. Todo material sólido deposita-se, então, no fundo do canal, reduzindo a profundidade. Consequentemente, diminui também a capacidade de transporte de água na hora da chuva. É o que acontece com o Tietê. Em vez de ter espaço para passar, por exemplo, 1.000 metros cúbicos por segundo, só “cabem” 500. Os outros 500 transbordam.
Isso acontece também com os afluentes do Tietê?
Júlio Neto – Pelo contrário. Eles têm declividade forte e velocidade grande de água e não assoreiam. Consequentemente, das cabeceiras até chegar ao Tietê, eles têm facilidade de transporte de material sólido. E como o Tietê tem velocidade muito baixa, esse material se deposita no canal do próprio Tietê.
Sempre foi assim?
Júlio Neto – O Tietê sempre teve velocidade baixa. Não dá para modificar isso. É a conformação geológica e topográfica do rio.
Anualmente quanto de resíduos o Tietê recebe?
Júlio Neto – Na cidade de São Paulo, entre a barragem da Penha [Zona Leste] e o Cebolão [Zona Oeste], aproximadamente 1,2 milhão de metros cúbicos de terra. Se você deixar isso no fundo do rio, a capacidade dele diminui. E o que o Departamento de Águas e Energia Elétrica, o DAEE do governo do Estado de São Paulo, tem feito? O DAEE faz a limpeza, mas tira apenas 400 mil metros cúbicos por ano.
O DAEE tira só um terço.
Júlio Neto – Deixa, portanto, anualmente uma quantidade muito grande de sedimentos no Tietê, diminuindo capacidade de ele transportar as vazões de enchentes. No dia 8 de setembro, às 16h30m, no Viaduto da Casa Verde, um engenheiro mediu a quantidade de água que passava no rio. Deu 735 metros cúbicos por segundo. Ali, naquele trecho, se o canal do Tietê estivesse limpo, poderia passar mais de 1.000 metros cúbicos por segundo. Se o Tietê já transbordou com 735 metros cúbicos é porque  estava assoreado.
Se o Tietê não estivesse assoreado, a inundação de setembro não teria havido?
Júlio Neto – A inundação aconteceu porque o Tietê estava com mais da metade da sua capacidade obstruída por resíduos depositados no fundo do seu canal e que não foram limpos adequadamente pelo governo do estado.
Ou seja, tem de se varrer todo dia o lixo da “casa”. Se acumular…
Júlio Neto – Você tem um rio que deveria ter capacidade de 1.000 metros cúbicos por segundo. Se ele está sujo, a capacidade dele fica reduzida para 500,  por exemplo. Assim, se a quantidade de água devido à chuva for de 700 metros cúbicos por segundo, ele extravasa. Não tem jeito. Encheu porque estava assoreado.
Alargar o Tietê, avançando sobre as marginais, resolveria as enchentes?
Júlio Neto – Não acho que a solução seja por aí. Outro dia vi uma entrevista de um urbanista, dizendo que a prefeitura precisava tirar as marginais da várzea e colocá-las na encosta.  No meu entender, tirar as marginais do lugar é algo totalmente fora de propósito.
E o que fazer?
Júlio Neto – A calha do Tietê foi projetada há 20 anos. Na época, previa-se que a vazão de 1.000 metros cúbicos por segundo seria adequada para os nossos dias. Dez anos depois de iniciada a obra [levou 20 para ficar pronta], verificou-se que os 1.000 metros cúbicos já não seriam suficientes. Eram necessários 1.400. A urbanização foi muito mais intensa e mais rápida do que o imaginado. Ampliar o tamanho da calha não dá mais. A única forma de fazer com que a vazão voltasse a ser de 1.000 metros cúbicos por segundo é fazer piscinões. Infelizmente, pois são um mal necessário.
Por que infelizmente?
Júlio Neto – Do ponto de vista hidráulico, os piscinões são perfeitos. Retêm o pico das cheias dos afluentes, diminuindo a quantidade de água que chega ao Tietê.  É o único jeito de fazermos com que a vazão do Tietê baixe de 1.400 metros cúbicos por segundo para 1.000. Para isso, o governo do estado de São Paulo, via DAEE, projetou 134 piscinões. Entretanto, nos últimos dez anos, construiu apenas 43.
Um terço…
Júlio Neto – Pois é. Com isso, não conseguiu baixar a vazão de 1.400 metros cúbicos para 1.000. Ou seja, mesmo que a calha do Tietê estivesse limpa, ela seria insuficiente para uma capacidade de 1.300 metros cúbicos por segundo, por exemplo, que são vazões que ocorrerão daqui para frente, no período chuvoso, que vai principalmente de janeiro a março.
 Então até agora não choveu muito mesmo?
Júlio Neto – As duas enchentes ocorreram com chuvas moderadas. São chuvas do período. Ou seja, o pior está por vir.
E como resolver a questão das enchentes a curto prazo?
Júlio Neto – A calha do Tietê tem duas deficiências importantes e não  há como resolvê-las de pronto. Vamos ter de conviver com a insuficiência da calha por muitos anos ainda.
Por quê?
Júlio Neto – Primeiro: temos de fazer 91 piscinões.  Se eles levaram [o PSDB] 10 anos para fazer 43, levarão mais 20 para fazer os que faltam. Segundo: o governo do estado não está disposto a gastar mais do que a limpeza de 400 mil metros cúbicos por ano, quando são necessários  1,2 milhão. São duas deficiências que precisam ser resolvidas. Ou o governo do estado faz mais piscinões e limpa a calha do Tietê ou vamos ter enchentes frequentemente.
O senhor disse que os piscinões são um mal necessário. Gostaria que me explicasse.
Júlio Neto – Nós temos um sistema que conduz o esgoto doméstico e outro, as águas pluviais. Chama-se sistema separador absoluto. Porém, há 30 anos, a nossa “magnífica” Sabesp constrói redes coletoras de esgoto que jogam o esgoto diretamente no córrego mais próximo. O córrego é do sistema de drenagem e não do sistema de esgotos. Então, todos os córregos da região metropolitana de São Paulo e o próprio rio Tietê são esgotos a céu aberto. Os esgotos saem da rede, entram nos córregos. Portanto, quando se faz um piscinão num córrego desses, você retém não apenas a água da chuva mas a do esgoto também.
Quer dizer que o piscinão é um “esgotão”?
Júlio Neto – Na prática, os piscinões são verdadeiros esgotos, sim. Ainda mais quando a água fica parada. Daí, sim, ela decanta, formando um lodo no fundo. É uma situação sanitária extremamente desfavorável. Esse é um dos aspectos pelos quais eu não gosto dos piscinões. Na sequência, eles se tornam um tremendo problema; são foco de proliferação de doenças na cidade.
Ou seja, do ponto de vista de saúde pública o piscinão é péssimo?
Júlio Neto – Sim. Por isso eu digo que é um mal necessário. Só deve ser feito onde não há outra coisa a fazer. Não façam, pelo amor de Deus, piscinões para resolver alagamentos das cidades da região metropolitana, que são as enchentes das prefeituras. Deixem a água correr normalmente.
A curto prazo, não tem solução para o Tietê. E agora?
Júlio Neto – Esse trabalho tem de ser iniciado já. O governo do estado tem de passar a tirar 1,2 milhão metros cúbicos de resíduos do Tietê.  Precisa colocar mais dinheiro no orçamento, porque essas obras não são feitas em uma semana. E esse trabalho de limpeza tem de ser feito o ano inteiro. Ininterruptamente. É tirar, tirar, tirar, para evitar o acúmulo de resíduos no fundo do rio.
E se governo do estado de São Paulo não fizer a limpeza diária como tem de ser feita, nem investir os recursos necessários?
Júlio Neto – Então que avise a população. Avise-a também que a cidade vai inundar. Quanto aos piscinões, em vez de levar 10 anos para fazer os que 91 que faltam, que faça em 5 anos.
E se o governo disser que não pode?
Júlio Neto – Pode, sim. É só colocar dinheiro.
Isso implica estabelecer as enchentes como prioridade.
Júlio Neto – Se é que é uma prioridade… Não me parece.  Até agora, o governo de São Paulo não disse a que veio. A Câmara Municipal aprovou o orçamento da Prefeitura. A verba de córregos e galerias para o sistema de drenagem pluvial da cidade foi cortada pela metade. E olha que provavelmente nem o orçamento inicial seria suficiente. Mas não cortaram a verba de publicidade. Com essas atitudes, o  recado que deram é o de que enchente não é um problema importante.
Será que a Prefeitura e o Estado estão contando  com a ajuda de São Pedro?
Júlio Neto  – Eu não vejo com otimismo a nossa próxima estação chuvosa, não. Janeiro, fevereiro e março são os meses  das grandes chuvas. E nós vamos ter situações piores do que as tivemos.
Há quatro anos, quando foi concluído o bilionário rebaixamento da calha do Tietê, se propagandeou que São Paulo não teria mais enchentes. E agora?
Júlio Neto – Essa informação de que não teríamos mais enchentes em São Paulo era simplesmente uma mentira. Primeiro, a calha não tem a capacidade que deveria ter. Segundo, faltam 91 piscinões. Terceiro, se o governo não se propuser a tirar do fundo do rio a quantidade necessária de resíduos, nós vamos continuar tendo mais enchentes . Portanto, é mentira que não teríamos mais enchentes aqui.
Mas não tem jeito mesmo de se evitar inundação em Sâo Paulo?
Júlio Neto – A não ser que São Pedro se transforme num anjinho e diga: “Não chova mais na região de São Paulo, a não ser umas gotinhas…” Mas isso a gente não pode esperar, concorda?

Tucanoduto

Depoimentos colhidos pelo Ministério Público de São Paulo revelam os passos e a influência do lobista Paulo César Ribeiro, cunhado do governador Geraldo Alckmin (PSDB), junto a administrações municipais, inclusive a de Pindamonhangaba. O Ministério Público investiga Ribeiro, irmão de Lu Alckmin, mulher do governador, por suspeita de tráfico de influênciaO nome Paulo Ribeiro aparece em planilha de propinas apreendida pela promotoria. Genivaldo Marques dos Santos, ex-diretor da empresa Verdurama, contratada pela administração João Ribeiro (PPS), prefeito de Pindamonhangaba, afirma ter sido ameaçado de morte. Ele está colaborando com a investigação do Ministério Público. Paulo Ribeiro foi alvo de buscas da promotoria na manhã de 27 de dezembro. Oficiais da Polícia Militar, que trabalham no gabinete militar da Procuradoria Geral de Justiça, vasculharam a residência e um escritório do lobista.

terça-feira, janeiro 11, 2011

Cápsula da Cultura

Padrão Globo

A Rede Globo foi multada em R$ 2,6 milhões. Ela foi notificada para retirar as imagens hospedada em seus sites de uma festa de fantasias de alunos do Diretório Acadêmico da Faculdade Getúlio Vargas. A festa foi realizada em um ambiente reservado para casais. Apesar da placa com os dizeres “Sorria, você está sendo filmado”, vários casais usufruíram do “Cantinho do amor”. O problema é que as cenas de intimidade foram fotografadas e publicadas na internet. Além da exposição das pessoas em cenas sensuais, algumas das delas eram menores de idade. As imagens foram amplamente distribuídas por e-mail através de grupos de alunos. A Globo, dona da plataforma de blogs que hospedou as imagens, publicou o material. Além disso, não cumpriu a decisão da Justiça de primeira instância para retirar o material. Inconformada com a condenação, a Rede Globo recorreu ao Tribunal de Justiça de São Paulo que manteve a decisão do juízo de primeiro grau. O caso deve subir para o Superior Tribunal de Justiça. Segundo o site Conjur, em primeira instância, a Rede Globo foi condenada a cumprir a decisão, sujeita a multa de R$ 10 mil por dia. Como ela não retirou as imagens da internet, foi multada. Em segunda instância, a Globo recorreu pedindo para que a multa diária fosse substituída por um valor fechado de R$ 100 mil. Porém, o pedido foi negado pela 5ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP. O caso aconteceu em 2002 e gerou inúmeros constrangimentos para os fotografados. Diante dos fatos, as partes ingressaram com processos na Justiça a fim de buscar uma indenização. Oito anos depois, a ação de indenização de uma das vítimas ainda tramita na Justiça. Os autores das imagens, Gustavo Luiz Araújo Silva e Aleksander Mendes foram condenados a pagar uma indenização no valor de mais de R$ 500 mil. No acórdão, o desembargador Erickson Gavazza Marques afirmou que a indenização visa reparar prejuízos sofridos pela vítima e a multa tem a intenção de fazer com que a empresa seja desestimulada a cometer o erro novamente.

Copa 2014

Até o final do mês, o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, deve formalizar uma proposta para a FIFA, para que a capital paulista abrigue os estúdios do IBC (International Broadcast Center, ou centro internacional de mídia) durante a Copa do Mundo de 2014. A ideia é que o IBC fique no Anhembi. Por isso, o prefeito mandou preparar um filme que mostre as melhores imagens do complexo. O carnaval de São Paulo será um dos destaques do vídeo. O documento que Kassab entregará para a FIFA também inclui a proposta de São Paulo receber também o Congresso da FIFA. O evento, que reúne todas as seleções participantes, é realizado pela entidade no país sede do Mundial, meses antes da Copa.

quarta-feira, janeiro 05, 2011

Privataria

O governo de Dilma Rousseff entrou em campo anunciando uma iniciativa que poderá ser a joia da coroa de seu mandato: a ampliação, para o andar de baixo, do acesso à internet de banda larga. Um estudo do IPEA divulgado em abril traçou um retrato preocupante para o progresso do Brasil. Sétima economia do mundo, Pindorama é a 60ª colocada no acesso à internet rápida, atrás de Argentina (49ª), Rússia (48ª) e Grécia (30ª). O serviço, pouco, também é caro. O brasileiro gastava com a rede 4,6% da sua renda mensal per capita, contra 1,7% do russo e 0,5% dos fregueses das economias avançadas. É pouca, cara e também lenta, abaixo da linha d'água do padrão internacional. Pelo que informa o Ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, as operadoras de telefonia serão chamadas para expandir a rede, cobrando algo entre R$ 30 e R$ 35. Cobram em torno de R$ 110 e culpam os impostos, o que é uma meia verdade, pois se todos os tributos saíssem da conta, ela continuaria cara. De qualquer forma, o governo anuncia que pretende negociar com os Estados um alívio na tunga, que chega a 42% sobre o valor do serviço. Ou os barões da telefonia compram a ideia de levar a rede para a choldra, ou a Viúva entrará no negócio. Felizmente, chegou-se a um tempo no qual a presença do Estado num serviço público deixou de ser palavrão. A privataria ganhou bom dinheiro com um sistema sem banda larga no andar de baixo. Como o amor do poeta, terá sido eterno enquanto tiver durado. Se a iniciativa privada persistir na abulia, o Estado entra no mercado. Depois, se for necessário, cria-se, rápido, a CPI da Telebrás. Dilma Rousseff ficou conhecida na nobiliarquia petista como a doutora que chegava às reuniões com um laptop. Em seus oito anos de experiência no governo, viu murcharem iniciativas federais no mundo da informática, atazanado por espertezas, delírios e marquetagens. Algumas coisas que poderiam ter dado muito certo andaram devagar. A universalização do software livre na rede oficial patinou. Outras, que tinham tudo para dar errado, felizmente atolaram. Um plano delirante de compra de milhões de computadores para alunos das escolas públicas foi convertido num projeto-piloto, modesto e experimental. Desde o tempo dos tucanos, sempre há alguém querendo vender micros para as crianças. Até hoje, o que se viu foram ataques irresponsáveis à bolsa da Viúva. O sonhado computador de US$ 100 nunca conseguiu sair do laboratório de boas intenções de Nicholas Negroponte. Um projeto de popularização de máquinas com financiamentos do BNDES foi substituído pela competitividade do varejão, beneficiado por um programa de desoneração dos impostos. Já a fábrica de microprocessadores inaugurada em fevereiro pelo governo federal ainda não produziu um só chip. Na ponta do sucesso, o Gesac, um programa do Ministério das Comunicações, já levou 12 mil pontos de banda larga para cerca de 5.000 municípios. Se os barões da telefonia quiserem ver por onde o Estado começou a mudar a banda larga, e o que isso significa no andar de baixo, podem visitar o portal desses telecentros comunitários.

Diplomacia

Alguns países estão com dificuldade de instalar suas embaixadas em Brasília. O Sudão, por exemplo, ainda não tem uma sede definitiva na capital federal. Uma casa foi alugada no Lago Sul até que o Itamaraty encontre um terreno vago na cidade para doar ao país africano. Atualmente, Brasília abriga 121 embaixadas residentes, incluindo a missão da Liga dos Estados Árabes, a da União Europeia e o escritório da representação palestina. Mas o número de embaixadas é praticamente o dobro do que foi previsto no projeto urbanístico de Lúcio Costa, de 1957. À época, o arquiteto havia reservado 63 lotes de mesmo tamanho e conceito no Setor de Embaixadas Sul. Pouco tempo depois, foram inaugurados mais 31 lotes no Setor de Embaixadas Norte. Sendo que 12 deles nos últimos seis anos. Mas Lúcio Costa não errou. Ele usou como parâmetro dados oficiais da Organização das Nações Unidas. Em 1957, de acordo com a ONU, o mundo era formado por 82 Estados. Atualmente, são 193. Com os setores lotados, os países interessados em abrigar suas embaixadas em Brasília começaram a instalar suas sedes fora dessas regiões, 27 embaixadas já ocupam parte do Lago Sul.

terça-feira, janeiro 04, 2011

Carta Capital

Otimista em relação ao Brasil, apreensivo com o cenário internacional, Delfim Netto fala das perspectivas da nossa economia sob Dilma Rousseff.
Qual seria sua principal recomendação à presidente?
Delfim Netto: Até agora estou muito satisfeito com o que a Dilma está fazendo. Ela tem dado uma demonstração clara de que vai ser, na minha opinião, uma excelente presidente. Tem noção clara das necessidades do Brasil. E dos nossos limites. A formação do governo foi muito esperta. Ela tranquiliza a área economia e a Defesa. E o resto vai compondo e arrumando. Acho que ela deu uma demonstração clara de que vai enfrentar um grande problema brasileiro, a ineficiência da máquina pública. Não vai fazer nenhuma maluquice fiscal – não é preciso inclusive –, não vai fazer choque fiscal. O choque, sabemos, morre no papel. Logo depois se dissolve. O (Guido) Mantega foi um bom ministro. É um sujeito prático e organizou as coisas corretamente. Foi excelente a escolha do (Alexandre) Tombini para o Banco Central. A indicação da Míriam Belchior para o Planejamento é muito correta e ela continuará o trabalho de Paulo Bernardo, que foi um senhor ministro. Há dois fatos pouco visíveis a permitir uma melhora dramática na gestão. Primeiro, o governo está construindo um instrumento de apuração do déficit nominal por unidade de governo. Será um avanço espetacular. Segundo, a Dilma convidou o (Jorge) Gerdau para auxiliar na melhora da gestão do setor público. O Gerdau traz com ele a grande experiência da Fundação Dom Cabral, de Minas Gerais, de muito boa qualidade.
Mas o cenário externo mudou, para pior.
DN: O cenário internacional mudou radicalmente. Só tem vento de frente agora. A favor, não mais. Não acredito que isso vá se resolver sem uma renegociação das dívidas. O caso da Irlanda é, talvez, o mais típico e significativo. Ela havia feito uma reforma fiscal inteligente e conseguiu obter um desenvolvimento enorme. Mas acabou por incorporar o prejuízo do sistema bancário que nem era dela. Incorporou o prejuízo dos bancos alemães, franceses, norte-americanos. Foi a sua ruína. A Alemanha faz propaganda do fato de ter entrado no pacote de socorro à Irlanda. Mas não é para salvar a Irlanda, é para salvar os bancos alemães. E o sistema financeiro alemão terá de pagar um preço também. Isso é um processo que está apenas no começo. Vamos ter, primeiro, as consequências políticas. Cada eleição na Europa vai colocar no poder um governo mais nacionalista e mais burro que os anteriores. Vão imaginar que a solução é simples. É muito complicada. Enquanto não se impuser algum custo para quem fez a patifaria, não vai haver solução.
De qualquer maneira, a grande questão é como vão resolver essa enorme transferência de dívida do setor privado para o setor público.
DN: Exatamente. Como é que a sociedade vai se conformar com o fato de que 30 milhões de sujeitos que ganhavam a vida honestamente, trabalhando, foram desempregados por 30 desonestos. É uma questão moral, não econômica. Não vai ter solução. Simplesmente, porque querem socializar os prejuízos que se converteram, na verdade, em lucro dos bancos. Eles não perderam nada até agora.
Ao longo da segunda metade do século, sobretudo a partir dos anos 70, as crises começaram a se suceder e a operação de última instância do governo, dos tesouros, começou a acostumar os mercados de que não havia punição.
DN: Na verdade, os mercados sabem – e agora com consciência plena – que o governo cai, mas continua sustentando-os. Quer dizer, quem está na balança não é o sistema que roubou, que assaltou, mas o governo que permitiu a falta. É um problema que, à medida que a sociedade incorpora, entende a injustiça implícita nesse tipo de solução, resolve-se na urna. Não tem conversa. Urna e mercado têm um diálogo permanente. Quando o mercado faz suas artes, a urna o pune. Se a urna faz muita arte, o mercado a pune. Acho que está chegando a hora em que a urna vai punir o mercado duramente.
A União Europeia vai resistir?
DN: A União Europeia é uma grande contribuição à estabilidade política. A Europa sempre foi um continente conturbado desde o século IX: tem gente subindo e descendo, passando pelos outros e voltando. Tem um valor político muito importante, só que exige um trabalho muito maior. A grande verdade é que os países ainda não estão preparados para isso. Um sujeito não sai da Turquia, vai trabalhar na Alemanha e tem as mesmas oportunidades. São séculos de discriminação. É provável que a Comunidade Econômica Europeia murche por algum tempo, mas não vai se dissolver. Seria muito custosa a dissolução. O risco é a Europa ter um crescimento muito lento durante uma dezena de anos.
E os programas de redução da dívida vão tornar a situação muito mais difícil ainda.
DN: Muito mais. Por isso nada se resolve sem enfrentar o problema da dívida. Vamos ter o mundo crescendo um pouco menos, vamos ter a China crescendo um pouco mais, a Índia crescendo um pouco mais. O Brasil precisa prestar atenção nesse negócio, pois a China é uma linha de montagem. É o maior importador e o maior exportador do mundo. Se a economia chinesa murchar, as importações também murcham, e haveria um efeito sobre nós. A minha convicção é que temos um mercado interno muito importante, parecido com aquele dos Estados Unidos nos anos 1970. Há condições, desde que não haja uma situação dramática no mundo, para continuar a crescer 5%, 5,5%, nos próximos 15 ou 20 anos. O que abortava o crescimento brasileiro era, de um lado, a crise de energia e, do outro, a crise de balanço de pagamentos. Os dois estão relativamente superados. O que precisamos hoje é dessa arrumação que está sendo feita.
Mas e quanto a esse déficit crescente nas contas externas e o câmbio valorizado?
DN: Isso não vai continuar. Ao ser indicada, a Míriam Belchior disse quatro palavras mágicas: fazer mais com menos. Ou seja, há o compromisso de aumentar a produtividade. E parece haver também o objetivo de buscar uma taxa de juros real de 2% a 3%, parecida com a do resto do mundo. O Guido deu a garantia de que vai pôr em prática uma política fiscal musculosa para permitir ao Banco Central adotar uma política um pouco mais corajosa. Precisamos de um pouco de coragem para enfrentar essa massa de falso conhecimento que o setor financeiro divulga. Segundo essa visão do mercado, o Brasil é tão teratológico que, com a queda da taxa de juros real, ele desaparece. Mas acho que as coisas estão se estabelecendo com mais clareza.
Temos visto manifestações, principalmente em São Paulo, a favor de uma cabeça do setor privado no BC. O que configura uma grave insatisfação com a composição atual do Banco Central. Isso tem a ver com as convicções dos cientistas, como o senhor chama, não?
DN: Há muito tempo defendo uma medida importante: a estatização do Banco Central. A ideia de que quem está no setor privado tem conhecimento muito maior do que quem os controla é falsa. Os funcionários que estão lá são de alta qualidade, tão alta que logo que deixam o governo o sistema financeiro privado vai capturá-los, cooptá-los.
É um típico caso em que a urna disse uma coisa e os mercados querem outra.
DN: O presidente Lula, na sua intuição, disse algo certeiro: "O que vocês queriam? Que eu convidasse quem perdeu a eleição para vir para o governo?" É um inconformismo, no fundo um certo ranço autoritário por trás dessas manifestações. Em resumo: "Somos os portadores da virtude, do conhecimento e da ciência e da salvação, e esse povo burro não nos elegeu".
Por falar em virtude, a história do Brasil é de muita fortuna e pouca virtude no geral. O senhor vê mudanças?
DN: Estamos num caminho iniciado no passado, com a Constituição de 1988. A despeito de tudo o que se fala da Constituição, ela asseverou a preferência da população brasileira por uma sociedade- democrática, republicana e que caminha- pa-ra a justiça. Ou seja, aumentar cada vez mais a igualdade de oportunidade. O capitalismo, a economia de mercado, é muito eficiente. Não há dúvida nenhuma nem foi descoberto por ninguém. O homem encontrou na história, há quase 300 anos. É compatível com a liberdade de iniciativa, mas é altamente produtor de desigualdade. O homem não se conforta quando a desigualdade é muita. Então esse é o papel do Estado, empurrar o sistema na direção de desigualdade de oportunidades, civilizar o capitalismo.
Não houve um empobrecimento da atuação dos bancos centrais, que começaram a restringir exclusivamente a taxa de juros de curto prazo?
DN: É uma observação perfeita. Aliás, um dos avanços de Henrique Meirelles no fim do governo foi sua declaração sobre o mundo inteiro estar à procura de novos instrumentos. Na verdade, são os velhos. Os bancos centrais tentam recupe-rar os instrumentos que jogaram fora quando, em 12, 13 anos, forjaram uma grande mentira, a de que eles produziam a moderação. É mentira. Os banqueiros centrais foram conduzidos pela solução mais simplista: mexo na taxa de juros e acontece isso. O mais impressionante é que eles só mexiam na taxa de juros depois. Eles não comandavam o mercado, eram comandados. Mas havia uma aura de ciência, uma publicidade que dava para eles esse poder, que foi desmascarado completamente. Ninguém propõe deixar de controlar a inflação. O que se observa é a existência de mecanismos que provavelmente permitem o controle da inflação sem esse custo imenso que é ter de aumentar os juros a cada dia.
No momento da crise, o Banco Central brasileiro foi na contramão. Enquanto todo mundo baixou os juros rapidamente, o nosso ficou atrás da curva. Agora estamos com o seguinte dilema: a taxa de juros relativa é muito alta e ao mesmo tempo vivemos uma retomada inflacionária. Mas, se mexermos meio ponto ou um ponto na taxa, teremos uma inundação de dólares.
DN: E mais uma valorização do real. Na minha opinião, não sabemos direito de onde vem essa pressão inflacionária.- Não adianta falar em excesso de demanda e que isso é visível no resultado da conta corrente. O déficit em conta corrente é produto de uma supervalorização do real. Tudo se resume sempre nisso. A diferença na taxa de juros produz um câmbio fora do lugar. Além disso, há uma pressão inflacionária no mundo, não só aqui. Na China, em alguns países asiáticos, nos emergentes. Não sei bem o que a produz. Com a elevação do compulsório, ganhou-se um tempinho, uns 45 dias. Tanto que baixou a expectativa de juros de curto prazo, subiu a expectativa de longo prazo. Como você pode prevenir? Apresentando um programa transparente, crível em equilíbrio fiscal. Isso eles têm tudo para fazer. Se a presidente apresentar esse programa e o setor privado der um voto de confiança, os efeitos serão antecipados. Essa é a característica do sistema: vive-se de expectativas.
O que o senhor acha da proposta de reduzir a dívida líquida para 30% do PIB? O Tesouro não deveria emitir, com um pouco mais de ousadia, títulos em reais?
DN: Ele emite. Outro setor que funcionou bem foi a Secretaria do Tesouro. A gestão da dívida melhorou dramaticamente. Acho que estamos preparados para esse ajuste. Acredito nele porque não vai precisar nada dramático. Vai estabelecer o seguinte: as minhas despesas de custeio e transferência, ou seja, aquilo que não é investimento vai crescer um pouco menos do que o PIB. Não precisa fazer mais nada, não precisa pôr gente na rua, não precisa baixar salário, não precisa fazer o que os europeus e (Barack) Obama estão fazendo. Só será preciso enfrentar os interesses. Estamos em um regime democrático, os sindicatos vão tentar aumentar o salário mínimo. Mas os sindicatos têm 3 milhões de votos, se tiverem. E a presidente teve 58 milhões de votos. Quem ganha?
Como o senhor explica, diante do quadro comparativo entre o Brasil e o resto do mundo, a angústia de alguns, como se a situação fiscal fosse desastrosa?
DN: Acho que o terrorismo é para tentar manter a taxa de juros onde está. Eu fico mais espantado é alguém levar a sério as agências de rating. Outro dia vi um funcionário de uma dessas agências dando palpite. Elas só fecham o portão depois de todos os gatos terem ido embora. E continuam sendo ouvidas. E a turma continua pagando os serviços dessa gente. É um mercado de uma bondade que a gente não acredita. Os indicadores brasileiros hoje provavelmente são melhores do que aqueles de todos os países europeus chamados de PIIGs. No entanto, estamos lá no último BBB. E o pior é que essa gente que não sabe nada, que vende vento, 171 típico, fica dando palpite. "Se não fizer um aperto fiscal monstruoso..." Estão ameaçando nos rebaixar.
Tem um economista norte-americano que diz que, na cadeia alimentar da fraude, a coisa começa com a venda da hipoteca e termina na avaliação de risco.
DN: Esse mecanismo, na minha visão, está em processo de desmoralização. A nossa profissão está readquirindo a economia política que ela jogou fora nessa aventura de ter formalizado tudo e ter esquecido que nós somos uma ciência moral. Nós nunca vamos ter esse padrão: eu faço uma hipótese, construo um modelo, testo o modelo e o modelo que vale. O conhecimento da economia política é fundamental para a boa administração pública, não há dúvida. E nós destruímos isso. Mas estamos reconstruindo. E vai ser muito mais gostoso reconstruir essa teoria econômica do que tê-la destruído.
Keynes, por exemplo, escrevia com objetivos práticos. Mas a clássica economia dos anos 1970 para cá não se transformou em uma maquinaria ideológica para justificar certas práticas?
DN: Keynes era muito mais que um economista. Era um gênio. O problema é que um gênio hoje, o grande gênio da teoria econômica atual, diz o seguinte: "O desemprego é ataque de vagabundagem dos trabalhadores". E Keynes dizia: "Não, o desemprego é uma consequência do desarranjo de funcionamento do sistema". Essa é a grande diferença.
O que o senhor acha que vai acontecer nos Estados Unidos, além do risco de eleger Sarah Palin?
DN: Não acredito que ela vá se eleger. Obama vai ter de fazer muito bonito para se reeleger, mas acho que, se o candidato da oposição for Sarah Palin, ele se reelege. Há um limite para essas coisas. Os Estados Unidos são um país no qual existe inovação e crédito. Não funciona no momento porque o sistema econômico não tem motor de partida. Há 3 trilhões de dólares nas caixas das empresas não financeiras, e elas só investem em tecnologia poupadora de mão de obra. O oposto do que o governo quer. Os bancos têm excesso de reservas, mais de 1 trilhão de dólares. Mas o governo coloca outros 600 bilhões. Para quê? Comprar papéis dos bancos. Isso aumenta a reserva do setor, mas as instituições financeiras não emprestam porque ninguém pega emprestado. O trabalhador não acredita que manterá seu emprego. É um problema de confiança. Em algum momento, se Obama conseguir fazer pegar esse motor, as coisas andam.
Você não tem ponto de demanda efetiva. Ou seja, são as duas variáveis – consumo e investimento – que determinam a renda.
DN: São mesmo. O consumo é mais importante e o investimento depende daquele espírito animal que produz essas flutuações conhecidas. Na verdade, o que existe hoje nos Estados Unidos simplesmente é a ideia de que Obama, com toda a farolagem dele, com toda aquela apresentação, aqueles aspectos teatrais, escolheu economistas que trabalharam para salvar os bancos e pôr na rua o trabalhador. É isso que o norte-americano pensa. E tem de Obama a pior imagem. Acho que o programa de Saúde que ele propôs era formidável, um negócio civilizador. Mas os EUA recusaram. Ele cooptou as aspirações americanas, os Estados Unidos estavam imaginando o seguinte: "Esse vai ser um líder extraordinário que vai nos levar pra frente". De repente, ele usou todo aquele patrimônio para servir aos bancos.
Fez o oposto que o (Franklin) Roosevelt fez. Roosevelt que era um aristocrata, a primeira coisa que fez foi enfrentar os barões do setor financeiro e botá-los na linha.
DN: Exatamente. É só olhar o Relatório Pecora. O (Ferdinand) Pecora foi um procurador na década de 1920. Como do costume, tinham feito uma CPI e não estava dando em nada. Cerca de 90 dias antes de encerrar a CPI, ficava muito ruim apresentar para o mundo um relatório inútil. Pegaram um procurador em Nova York, o Pecora, com a missão de fazer a CPI funcionar. Ele pôs os procuradores nos bancos e descobriu todas as patifarias. Aí chamou para o banco dos réus o JP Morgan. Mostrou que era um canalha, que tinha lista secreta, que protegia seus clientes, que enganava as pessoas. Esclareceu tudo o que tinha sido feito. Depois de 80 anos, os bancos conseguiram fazer de novo tudo que tinha sido condenado. Hoje é a mesma coisa. E agora que estão apurando, mesmo que lentamente, são as mesmas patifarias. Quer dizer, o banqueiro volta para o lugar do crime, não adianta ter ilusão.
JP Morgan, descendo do seu iate em certa ocasião, fez um discurso raivoso contra Roosevelt.
DN: O sistema financeiro é fundamental para o desenvolvimento econômico. Só que o sistema financeiro não pode ser senhor da economia real. Ele tem de estar a serviço da economia real. Por isso é preciso um Banco Central realmente forte para controlar esse mecanismo. Porque o papel fundamental do Banco Central não é controlar a inflação, é controlar a rigidez do financiamento do sistema real.